sábado, 14 de setembro de 2013

Brinco de brilhante

Ficou todo feliz ao receber o presente, mas logo em seguida o seu olhar já havia se transformado em névoa.
- Pôxa, é muito bonito! Mas como eu vou fazer para entregá-lo? Se eu disser que foi você quem deu, ela me mata e também não vai querer colocar na neném e eu quero que ela use.
- Diga então que foi você que comprou.
- Não posso, o certificado de garantia da joalheria já tem mais de um mês, ela vai desconfiar.
- Entrega sem o certificado,  não tem problema não. A pedras não têm garantia, só o ouro. 
- Eu posso dizer que foi sua irmã que deu? Fica mais fácil. 
- Diga então que foi a velha, ela não é sua dinda?
Ficou combinado assim. Marli não se importava que não soubessem que era ela que estava dando o presente. Ela só queria fazer um carinho para ele. Afinal, havia ficado a amizade entre eles. Pensava que um presentinho não era nada de mais.
Toda a sua família tinha sido convidada para o chá de bebê, menos ela. Teve que entregar o seu presente depois. Escolhera com cuidado, queria que fosse algo especial. Ele merecia. Comprou um brinquinho  e o entregou com um cartão: "...Desejo que o caminho de sua filha tenha muita luz e que traga brilho à sua vida" 
Tempos depois ele pergunta se a velha tinha sido avisada, porque "ela" (a patroa) ao receber o mimo poderia querer agradecer.
A princípio, quando conversavam sobre a bebê ele sempre falava sobre Liliane (a patroa). Depois começou a se referir a ela como "a mãe", e agora somente usava o pronome. André retirava a identidade dela, assim como a  presença de Marli em sua vida. Marli achava a situação muito estranha. O quê será que André havia falado sobre ela para que tivessem que manter  a amizade de tantos anos em segredo? Por que Marli não podia aparecer?
Pensava que a sua relação com André sempre fora baseada principalmente numa amizade sólida. Os desentendimentos, na maioria das vezes, eram por questões financeiras. André, por ser desapegado, sempre dizia que Marli só se preocupava com dinheiro, que o dinheiro vinha em primeiro lugar. Ela vivia falando em economizar e nunca gastava consigo mesma, somente em pagamento de contas e com ele. Nunca entraram em acordo sobre isso. No mais, sempre se apoiaram. 
Liliane não conhecia a velha, entretanto quando ligou para agradecê-la, conversou com uma intimidade  tamanha. Foram mais de dez minutos de papo: falou da espera da hora, das dores que estava sentindo e da emoção ao receber o brinco. Nunca vira coisa mais linda, um brinco de brilhante!
A velha, coitada, mantinha a conversa meio que constrangida. Nem sabia direito do que se tratava. Marli apenas a avisara de que talvez recebesse um telefonema agradecendo um presente, não entrara em detalhes. Nem tinha dado muita importância para isso. 
E agora vem essa novidade: o seu presente rendeu um convite para que sua velha mãe fosse convidada para dar o primeiro banho na filha de André. Quanta honra para uma desconhecida!
Liliane deve ter ficado muito "impressionada" com o brinco. A amizade de Marli ela não aceitava e o pai da criança nem podia frequentar o mesmo lugar em que ela estivesse. Mas a sua mãe daria o primeiro banho na filha deles...
Marli ficou enojada. Quanta mentira, quanta falsidade!
Mal sabiam eles que o brinco é de zircônia. 

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A porta



 
Saio de fininho como quem não quer ser visto.
A porta ficou entreaberta. Não quis batê-la para não causar alarde.
Saio aos poucos. Sigo em passos curtos.
Não vou olhar para trás.
Com o que ficou já não me identifico mais.
Vou com a cabeça ereta e a alma pura.
Quero a liberdade do vento no rosto.
Não estou em busca de nada.
Nada além do que existe dentro de mim.
Eu só quero ser.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Olhar em cores


"Olhar em cores"

você pode me olhar, olhos negros
você pode me ver com o olho azul
não me olhe marrom - "marromenos"
quero ver de longe o verde seu

me enxergue nua transparente
ou em vermelho com a roupa que me conheceu
o mesmo tom vermelho do meu coração
que ainda insiste em ser seu

sábado, 22 de setembro de 2012

Mesa Branca



- Sabe por que você está sozinha? É porque você não tira esse homem da sua cabeça, minha filha. Você não para de pensar nele... 

(a Mãe de Santo apontou para uma fileira de búzios jogados aleatoriamente e caídos formando uma fila indiana. Isolados num canto, havia dois búzios, um sobreposto ao outro)

- Você está vendo aqui? Este é o seu destino, traçado de forma clara, passo a passo. Você tem um caminho lindo a seguir. O homem que você não tira da cabeça é casado e tiveram um filho, não é? 
Olha aqui os dois: a vida deles está paralela à sua. É você quem decide. Quer viver à margem? 
Quer viver esperando sem ele nunca chegar?  Ele gosta muito de você, ele pensa em você, mas vive com a outra. E você é tão linda...!
A velha olhava com olhos de criança e repetia: você é tão linda...tão linda...!

Era tudo tão claro, mas ela não queria entender. Por isso fora procurar uma resposta. Saiu dali ainda sem saber o que fazer.