sexta-feira, 22 de julho de 2011

Nós


Alessandra e Carlos trabalhavam na mesma empresa. Eram vendedores de uma loja  numa cidade do interior, dessas que fecham todas as portas na hora do almoço.
Movimento bom mesmo só em dia de segunda por causa da feira. No resto da semana era um marasmo. Ficavam em pé a manhã toda, às vezes não atendiam nenhum cliente e nem precisavam voltar à tarde. 
Alessandra queria um emprego melhor. Já tinham um filho e outro a caminho. Sonhava em dar uma vida de conforto com bons colégios, brinquedos, roupas.
Carlos ouvia e concordava, mas nada fazia. Alessandra o convenceu a voltar a estudar - que tal um concurso público? Começaram a estudar juntos, ela mais professora do que estudante. Fizeram um cronograma de estudos e cumpriram rigorosamente. 
No dia da prova, Alessandra ficou apavorada com a ideia de ser aprovada e ele não. Agindo  como mulher apaixonada, deixou muitas questões em branco. Não quero atrapalhar nosso casamento, primeiro ele e depois eu - pensou. E assim aconteceu. Carlos foi aprovado e tomou posse. No ano seguinte, Alessandra. Deram início a uma vida de fartura
Mudaram para uma casa melhor, com quartos para cada filho, quintal, jardim com varanda. Mandaram fazer móveis novos, equiparam a cozinha com eletrodomésticos de última geração. Fim de semana passeio com as crianças. Tudo ia caminhando bem e todos os dias eram iguais.  Da casa para o trabalho e do trabalho para casa. 
Carlos foi promovido, dobrou o salário e passou a ser mais exigente. Dava tudo do bom e do melhor e passou a cobrar por isso. Sua esposa não podia mais usar blusa sem mangas, saia acima do joelho, calça justa, short, maquiagem e nem mesmo sorrir. 
- Fecha esses dentes, mulher! Por quê está se abrindo toda?
Ela não saía mais sozinha, somente  para trabalhar. Era acompanhada pelos filhos  para ir ao supermercado, feira e farmácia.  O tempo que ela e as crianças passavam fora era controlado. Ao contrário, cada vez mais, Carlos se distanciava de casa. Saía com os amigos, jogavam dominó, tomavam umas cervejas e o papo era bom, somente isso. Aos poucos a farra foi se estendendo de sábado até domingo, quando retornava. 
Se os meninos estavam bem e eram felizes, a rotina sem alterações, sua vidinha era organizada, o quê mais ela poderia fazer?
Observar. 
Notou que todo dia, sempre à mesma hora - 12:50 - uma determinada cliente entrava na repartição e era atendida por Carlos, só sorrisos.
Chegou a reclamar um dia e levou uma bronca, que maluquice! Ele, inocente, fazia questão de atender aquela senhora por ser a melhor cliente. Tinha que ser gentil, ora bolas! 
O tempo foi passando...
Um dia percebeu os dois com as mãos sobrepostas em cima da mesa, ela de aliança e ele, sem.
Já era tarde, estavam com casa montada.

3 comentários:

José disse...

Não vou dizer cem palavras para comentar este texto, mas vou dizer que gostei, está muito bem escrito.
Só não gosto é dos Carlos, que assim que sobem na vida, pensam logo que já podem magoar, e humilhar os outros.

Um bom fim de semana,
beijinho,
José.

Mônica disse...

Engraçado
Era o que eu dizer pra voce e José já disse.
Detestei o Carlos mas o texto é muito bom, deu até para me dar raiva.
com carinho Monica

Vinicius.C disse...

Uauu!

Gostei muito, bem escrito com gosto sempre de quero mais!

Um beijo enorme e um ótimo fds!

Espero por vc no Alma!